Sentei-me pra ler um livro num banco.
Era um banco de madeira, comprido, e só eu me sentava nele. O
tempo estava nublado, e a luz solar se espalhava de forma difusa através das nuvens
pesadas. A brisa que soprava era leve e fresca, apenas o suficiente para que eu
a sentisse na pele, e não movimentasse involuntariamente as páginas daquele
livro que eu estava prestes a abrir.
O banco estava entre os pilotis de um bloco de salas de
aula, na universidade. Aproximava-se a metade do turno da tarde – a maioria dos
estudantes se amontoava nas filas enormes de lanchonetes. Torravam seu dinheiro
em cremes de açaí e croissants de
chocolate, para depois se sentarem nas mesinhas engorduradas, enquanto
reclamavam dos projetos e dos professores. Estudantes de Arquitetura,
principalmente.
Um garoto passou entre aquelas muitas mesas perguntando se
alguém se interessaria em comprar brigadeiro. Ofereceu-me um, mas recusei de
forma educada – prefiro ler com estômago vazio. Ele agradeceu e seguiu em
frente, passando por uma garota que, aguardando sua vez na fila para comprar
uma latinha de Coca Cola, arrebitava o bumbum e tomava fôlego para que os seios
parecessem maiores. Garotos a observavam, e discutiam sobre ela. A vontade que
sentia de acertá-la com o livro que tinha em mãos era enorme, porém fui capaz
de me controlar. Além do que, ainda nem havia começado a lê-lo – sequer estava
aberto.
O relógio marcava 16h, e aos poucos o lugar foi se
esvaziando. Restavam apenas as moças que trabalhavam na lanchonete, e um ou
outro estudante atrasado (além dos vagabundos que, como eu, recusavam-se a ir
para suas salas de aula). Duas garotas, com camisetas do curso de Design,
sentaram-se no banco ao lado do meu. Desejei expulsá-las a pontapés, mas acabei
me dando conta de que fofocavam sobre uma festa que havia ocorrido no fim de
semana passado – na qual havia pessoas que eu conhecia. Me interessei nas
possibilidades e me concentrei no que falavam.
Lá pelas 17h30 elas se cansaram de falar, e resolveram sair
dali. Após tantas informações novas – apesar de muito irrelevantes – resolvi me
levantar e tomar um copo d’água. Quando voltei pra me sentar, havia uma pessoa
sentada no meu banco. No meu banco. Eu
até aceitaria dividi-lo, dependendo das circunstâncias, mas seu traseiro
repousava exatamente no mesmo lugar no qual eu antes confortavelmente estava. E
ele sabia disso. Ainda que tentasse disfarçar, era evidente que em tudo havia
um propósito.
Éramos íntimos o suficiente para que eu chegasse reclamando
daquela usurpação. Uma pequena discussão seguiu-se por cerca de trinta minutos.
Lutei pelo lugar que havia conquistado utilizando tantas piadas e criancices
quanto pudesse. Quando finalmente desisti e aceitei dividir o banco, ele costumeiramente
se levantou. Disse tchau e se virou para ir embora, mas não sem, antes,
voltar-se novamente para mim.
- Você é bem estranha, sabe.
Então seguiu seu caminho. Mamãe me ligou quase que
imediatamente, avisando que estava me esperando no ponto de ônibus mais
próximo. Guardei o livro na mochila e segui lentamente até onde estava o carro,
ainda que já estivesse atrasada para a aula de alemão.
Acabei não lendo o livro.
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