30 de março de 2011

Os Corvos


“Eu quero sair!”. A garotinha gritaria assim por horas, e então, por dias... Era como se seus gritos desesperados pudessem leva-la pra fora naqueles momentos em que ela mais precisava manter-se dentro.
Sua esquizofrenia costumava assustá-la, mas já não era mais assim. Seus delírios, suas visões, tudo aquilo começava a maravilhá-la. Enxergar um mundo totalmente diferente, novo – totalmente pessoal – parecia incrível. “E o melhor de tudo”, ela dizia às paredes, entre dentes sorridentes, “é que eu não sou capaz de distinguir o real e o imaginário.”.
Ela havia passado a maior parte da vida naquele manicômio. A família, muita conservadora, abstinha-se do dever de cria-la. “Talvez, se seus sintomas fossem positivos... Mas, esquizofrenia residual? Perdoe-me, Doutor, mas nossa família já possui prioridades demais”. E assim ela lá foi jogada, no Manicômio Applefield, apenas para crianças abandonadas.
Quando conseguia vencer as enfermeiras pelo cansaço, era então levada para a campina que não muito se estendia, acabando em uma floresta densa e verdemente viva. Vez ou outra guardava nos bolsos do vestido de cetim preto alguns grãos que encontrava no chão próximo à cozinha, e então se sentava à sombra de uma árvore e, grãos nas mãos, esperava a chegada de seus grandes amigos, os corvos.
Eles chegavam primeiramente de forma discreta, mas logo vinham tantos que às vezes até o Sol parecia sumir. Comiam das mãos da menina, batiam suas asas próximas à pele dela e, quando iam embora, deixavam um enorme rastro de penas negras e brilhantes. Ela então as guardava no bolso onde outrora escondera os petiscos daquelas aves, e às vezes enrolava umas numa mecha de cabelo, achando graça da forma como penas e cabelo pareciam uma coisa só, naquela cabeça cor de noite.
Pra ninguém contava os segredos de sua amizade. Fugia de todos que se aproximavam, achando que a indagariam acerca de seus pássaros. Assim que o último deles sumia no céu, corria para seu quarto, não dando tempo nem às enfermeiras de a perceberem, refugiando-se daquele mundo colorido.
E assim seguiam os dias. Ela acordava, chorava, ia para fora, voltava fugida, olhava catatonicamente para as janelas de vidro emolduradas por cortinas cheias de maçãs, jantava, e então dormia, ansiosamente, só esperando tudo começar outra vez. Pouco aproveitava de lâmpadas ou velas. A luz do Sol a atraía pela impossibilidade de ser apagada, apenas.
Um dia, enquanto alimentava seus pássaros, ouviu que por detrás da árvore alguém lhe chamava. “Lena... Lena...”. Virou-se antes que pudesse perceber a voz, e viu o mais magnífico corvo de sua vida. Ele era grande, grande como uma casa, e parecia abraçar o mundo com suas espetaculares e negras asas. Seu bico comprido abria-se e fechava-se, e continuava a falar. “Lena... Venha... Lena... Venha...”, ele a chamava, em direção à floresta de frente ao manicômio. Seus olhos fechavam-se e abriam-se em deleite, enquanto ela caminhava, guiada pelo próprio êxtase. Nem foi capaz de escutar as enfermeiras desesperadas, “Helena, volte! Helena, a rua!”.
Quando ela sentia-se entrando na floresta, o corvo gralhou horrível e agudamente. Começou a partir-se em linhas vermelhas, até desaparecer em uma explosão de fumaça densa e negra, fazendo-a acordar. Um caminhão buzinava freneticamente, e antes mesmo que ela tivesse chance de agir, foi atingida em cheio.

29 de março de 2011

Os Tristes Tigres na Grande Terra de Populi

Era uma vez quatro tristes tigres. Eles caminhavam pela Grande Terra de Populi, cabisbaixos, procurando um lugar onde pudessem se encaixar. Passaram pela Campina de Esopo, mas tropeçaram em uvas verdes e foram expulsos por uma raposa de olhos insanos. Andaram pela Terra de Grimm, mas não foram bem recebidos nos castelos: os guardas temiam que sua melancolia arruinasse o “Felizes para Sempre” que levaram tanto tempo para instituir como regra geral.
Atravessaram ainda, sem sucesso, a Cidade de Dita-Lex, mas as corujas que se postavam na entrada da cidade os espantaram com azeite e fogo. Então tentaram, sem sorte, atravessar os altos muros de pedra do Castelo de Margarida, bem na entrada Sul do Estado de Cantare. Mas os cavaleiros que se ocupavam em abri-lo pedra por pedra não permitiram sua passagem. Por fim, se detiveram numa estrada comprida, indicada como Caminho de Travas.
Não havia qualquer guarda, cavaleiro, animal, parede ou calabouço que pudesse impedi-los de seguirem por ali. Andaram por algum tempo quando, enfim, se detiveram numa encruzilhada que indicava duas opções de caminho: para a direita, “O Trigo de Travas”; para a esquerda, “Os Pássaros de Travas”. Os tigres menores, que eram três, aguardaram que o tigre maior indicasse o caminho que seria mais conveniente.
- Vamos para o Trigo – O tigre maior começou a caminhar para a direita, mas apenas dois dos tigres menores o seguiram. O terceiro pequeno e triste tigre continuou parado.
- Eu quero ir para os pássaros – Ele fazia um choro infantilizado, forçadamente felinizado.
- Tem certeza? – O tigre maior interrogou-o. Ele via nos olhos dele um mesmo desejo de desafio que acabara deixando-os quatro tristes, famintos e separados de sua terra-mãe. O pequenino meneou positivamente com a cabeça. – Pois bem, boa sorte.
Assim, três dos tigres tristes seguiram pela direita. Um, um só, triste tigre solitário, para a esquerda.
O caminho dos três tigres foi longo, mas eles finalmente chegaram a uma extensa plantação de trigo, com uma pequena casinha de madeira posta no meio do caminho, e uma pequena e tristonha menina sentada em degraus de madeira. Aos seus pés, quatro pratos cheios de trigo, gordo e dourado trigo. Os tigres tristes se aproximaram lentamente. O menorzinho de todos falou, pois sua vozinha era mais felina que a dos outros.
- Com licença, senhorita. Para quem são os pratos de trigo? – A garota parecia tão triste e faminta quanto os tristes tigres.
- Não sei. Mamãe mandou que eu esperasse para ver se alguém passava. Ela disse que eu só posso comer do meu depois de alimentar alguém com os outros três. – Ela levantou os olhos do chão e abriu-os inteiros, mostrando-os totalmente gigantes e brilhantes – Vocês aceitam?
Dessa forma, os três famintos e tristes tigres comeram, cada um, um prato de trigo, e assim fez também a triste e faminta menina.
O tigre solitário que seguiu para onde ficavam os pássaros de Travas andou bem pouco antes de alcançar o lugar. A área era enorme, rodeada por árvores, formando uma pequena praça social dos pássaros ao centro. Eles voavam livremente, e alguns até arriscaram brincar com o tigre – que não ficou nem um pouco menos triste com isso.
Caminhando mais um pouco, ele chegou até uma árvore onde havia um animal marrom, felpudo, com olhos pretos pequenos e uma boca enorme, com dentes serrados. Ele gritava com voz de locutor, e não se parecia nada com um pássaro.
- Ei, você, senhor tigre! Parece tão tristonho, mas vejo que é um animal muito distinto, inteligente... Aceitaria um pequeno desafio? – O tigrezinho se aproximou, ávido pela pergunta, quando esse animal esquisito deu um passo para o lado e deixou à mostra um ninho cheio de pássaros estranho, de pernas compridas e finíssimas. – Você vê, senhor, que eu aqui tenho um ninho com sete mafagafos. Será que poderias, como sua inteligência felina, desmafagafizá-los e tornar-se um Supremo Desmafagafizador?
O tigrezinho nem hesitou, subiu num só pulo ao galho do ninho. Tão logo estava no alto, o esquisito animal desceu da árvore.
- Ei, aonde você vai? Você nem me disse como se desmafagafiza um mafagafo!
- Ora, meu distinto felino, isso faz parte do desafio! – Assim, o animal, chapéu na cabeça, seguiu caminhando até desaparecer de vista. O tigrezinho, seduzido pelo desafio, foi incapaz de fazer o mesmo.
O tigrezinho olhava, tocava, sacudia os mafagafos, mas não fazia nem ideia de como desmafagafiza-los. Depois de inúmeras tentativas, ele continuava lá, olhando-os, tocando-os e sacudindo-os. E, conforme os anos seguiram, do galho ele não descia e, de triste tigre, acabou tornando-se um louco.
Quem hoje em dia tem a sorte de passar pela Terra que outrora fora Populi, jura que escuta, próximo às plantações de trigo, uma voz melodiosa e brilhante cantando, junto ao vento “Três pratos de trigo para três tristes tigres...”. Outros ainda juram que, próximos às árvores frondosa, dispostas em círculo, uma voz lamuriosa, melancólica e insana clama “Num ninho de mafagafos, sete mafagafinhos há... Que melhor os desmafagafizar, bom desmafagafizador será...”.

26 de março de 2011

Reflexões acerca da vida em um parágrafo.


Eu não vou fingir espanto, porque seria muita hipocrisia, mas como os dias se tornaram diferentes. O Sol brilha verdadeiramente, as flores perfumam escandalosamente, as cores saltam alegremente e a vida realmente respira e pulsa. E ainda existem pessoas que reclamam quando você acorda de “bom humor”, "exageradamente feliz", “com três pés direitos”, “sorrindo pras paredes”. É culpa desse planeta onde o normal é sentir-se mal e insatisfeito. Mas não é assim comigo, não mais. Um dia, quando você acorda e decide verdadeiramente fazer da sua vida uma alegria real, você acaba descobrindo que [longe de uma estratégia de marketing de empresas de cosméticos] “o natural é sentir-se bem”.

Imagem: Tumblr

25 de março de 2011

Ei, você.

"Ei, você.

É, você mesmo.

Você acha que eu não sei, né? Acha que é tão bom assim em esconder as coisas de mim? Saiba você que eu sou muito mais inteligente e capaz do que pareço. Podem me chamar de "burro" e outras coisas do tipo, mas no final eu sempre acabo por cima. E não há forma de resisitir a isso. Você pode bater o pé, gritar, falar todas as barbaridades que desejar, desmentir suas próprias palavras, e tudo continuará da mesma forma. Você é pequeno, inútil, insignificante e, acima de tudo, cheio de uma prepotência que só não é mais ridícula do que sua própria existência.

Você acha mesmo que eu não sei das suas histórias, das mentiras que você conta, das bagunças que você apronta, dos planos que você maquina com sua mente maldosa todas as noites? Mas, antes mesmo de te acusar de qualquer coisa, acho bom você saber que nada do que você faz me atinge de verdade. Não, sério, acaba comigo te ver acreditando em todo o sofrimento que eu finjo tão bem sentir, cada uma das lágrimas falsas que eu derramo e o júbilo que elas te causam. Talvez, ciente disso, você queria repensar esse seu escândalo ensaiado na frente do espelho - acha que eu também não sei sobre ele? Ah, e só pra constar, você é tão horrível na atuação que nem um cachorro acreditaria em cada uma das palavras que saem da sua boca. Mesmo ele, que nunca as entenderia.

Não vou me estender, estou cansado e gastar mais tempo com esse aviso é mais desperdício existencial do que eu estou disposto a jogar fora. Se você quiser ignorar isso tudo e seguir em frente, eu não tenho nada mais a dizer do que "Ajoelhou, vai ter que rezar". Somente te peço que seja rápido, estou me enfadando facilmente nos últimos tempo, e esperar não seria nenhuma contribuição.

Um beijo ácido e um abraço cheio de peçonha;

Sua alma."

[Texto produzido em um momento de reflexão acerca de como as pessoas encaram a própria alma. Eu, como uma pessoa sensata, não me encaixo nisso porque trato minha alma com muito carinho. Aos que assim não fazem... Boa sorte ;D]
Imagem: Daniel Handler/Lemony Snicket e Stephin Merritt

25 de Março

Adivinha que dia é hoje? Dia do aniversário da MINHA Mônica Aires! (Saiba que, neste momento, eu estou relevando sua não resposta aos meus últimos e-mails. Sou mais ou menos como um cachorro: podem me chutar, ignorar e deixar sem comida, mas eu sempre pulo no colo e abano o rabinho na primeira oportunidade.). Eu preciso dizer que, apesar de você não ter me parabenizado pelo meu aniversário, eu aprendi a não pagar o mal com mal, mas sim com o bem. Mas vamos pular essa parte, ok?
Um pouquinho de algodão doce pra você *-*
As pessoas falam que o tempo e a distância destroem todos os sentimentos, até os mais fortes. Alguns até dizem que a distância impede que qualquer coisa se desenvolva. Bom, apesar de às vezes a distância quase me matar de ódio, eu vou precisar questionar tudo isso seriamente.
Eu te amo muito, muito mesmo, Mô. Por que você me escutou, me deu atenção, me tratou como uma pessoa de verdade (não como um robô, como até mesmo meus amigos mais próximos me enxergam). Vou pegar emprestada uma frase do filme “Réquiem por um sonho”: “Você me faz sentir como uma pessoa”. Em todos os nossos pequenos momentos virtuais, você deixou claro para mim como você é gigante. Gigante de alma, de espírito, de coração. Sempre que eu me lembro de você, sinto uma vontade de me aninhar nos seus braços, e então dormir por várias horas, ou simplesmente... Me acalmar; como uma mãe, uma irmã. Uma amiga. É.
Eu sinto uma vontade imensa de chorar quando me lembro de todas as dificuldades que me impedem de chegar até você. Sempre que eu planejo viajar até São Paulo, ou até uma outra cidade onde você estará, algo sai errado (a maldição dos 15/16 anos). Acabo sofrendo, repetindo que sou uma pessoa altamente incapaz. E fico morrendo de vergonha de falar com você sobre isso, me sentindo péssima e pouco empenhada, esperando de você a mesma reação sobre mim. Eu tenho um complexo de inferioridade bastante acentuado, note.
Sendo assim, eu MORRO de ciúmes das meninas que conseguem viajar pra te ver, ou, pior, QUE JÁ MORAM EM SP. Pode me chamar de boba, mas, ai, sinto mesmo. Sinto ciúmes de todas elas. Mas, poxa, eu amo tanto você e a Lu, oro por vocês todos os dias, peço pra Deus me ajudar a chegar até vocês, será que eu estou errando em alguma parte? Me diz!
Sabe, existem pessoas que acreditam em amor à primeira vista. Então, porque duvidar de carinho à primeira vista? É, foi mais ou menos isso (exatamente do tipo de uma criancinha para a mãe/irmã). E eu lamento muito, e te peço um milhão de perdões se alguma vez a minha incapacidade de me comunicar sempre com você me fez soar como falsa, interesseira, negligente e/ou desprezível. A Bíblia diz para que não juremos, nem pelos céus, nem pela terra, mas que seja nosso sim, sim, e nosso não, não. E aqui estou eu, em toda minha verdade e sinceridade, afirmando eu nada disso eu sou. Eu te amo de verdade, mesmo. Te amo com o mesmo amor que Jesus nos amou na cruz, aquele mesmo amor de 1Co 13. Vou resumir tudo em um só versículo.
"Um novo mandamento lhes dou: Amem-se uns aos outros. Como eu os amei, vocês devem amar-se uns aos outros." João 13:34
Foi esse o amor que eu escolhi para a minha vida. E engraçado, quando eu abri na página da Bíblia Online pra procurar uma versão mais simplificada do versículo, e percebi que um dos versículos do dia falava sobre fé, e eu percebi como tinha me esquecido de falar da sua fé. A fé que você tem em Deus, e fé com que você fala do seu pai, a fé com que você fala do Seu outro Pai. E sabe, você sente tanta falta daquele pai que morreu, mas saiba que esse outro Pai nunca morre, Ele está sempre conosco. Ele também nos abraça, nos embala, nos faz dormir, nos dá razão para viver. Por favor, nunca se esqueça disso. É o mesmo Pai que ama muito à mim; Ele a ama ainda mais.
*pausa para enxugar as lágrimas*
OK, agora chegou a hora do ponto alto deste texto:
OGI VAI TÊ UMA FEIZTÁ
BOLIGUARANAH, MUITUS DOSSIS PRA VOSE
EH U CEL ANIVERÇARU
VAMUS FESTEJAH IUS AMIGUS RECEBÊH
[...]
PARABEIMS (UHU)
PARABEIMS (UHU)
OGI EH CEL DYA, KI DYA MAIZ FELISS!
(Eu tenho medo de te chamar de “monstra”, porque talvez você não compartilhe de tudo isso que eu disse e não me dê o direito dessa nem de qualquer outra palavra semelhante, mas bem, é que eu chamo todas as minhas amigas de monstras – cocós, mumus e outros nomes afins – de forma que pra mim seria muito natural... Eh, hum, se você não gostar, me avisa, que eu apago NA HORA!)
Sua monstra não-mais-ruiva, parabéns. Hoje é seu aniversário (SÉRIO?), hoje é aquele dia de cobrar de todo mundo o triplo de atenção, o triplo de carinho, e claro, o triplo de presentes rs. O meu estará guardadinho aqui comigo esperando a gente se encontrar. Talvez, TALVEZ, se você for boazinha, eu te mande por Sedex. Mas é tão TALVEZ que você nem deveria ficar pensando sobre isso e orar DEMAIS pra que nossos planos “viajantivos” deem certo.
Ah, falando em Sedex...
Considerando meu castigo de Redes Sociais e considerando também sua não existência no meu MSN e suas não repostas aos meus e-mails, seria legal se você se lembrasse de me mandar o seu endereço, pra eu te mandar umas cartinhas. Eu amo cartinhas, acho que elas são muito mais sinceras, e fofinhas, e mimimi.
Senhorita Mônica A. Amaral, um beijo dessa Senhorita Luísa A. Amaral [Ramos].
Ich liebe dich so viel!
Deine Luísa.

24 de março de 2011

Sobre o tempo, desenhos e pessoas.

Ontem eu me peguei em um momento de muita nostalgia. Não sei se seria bem um momento – segundo um livro de medidas inglês, um momento corresponde a 90 segundos, e eu definitivamente gastei mais do que isso. A questão é que meu sofrimento foi devido a um momento de recordações dos desenhos animados que eu assistia quando crianças.
Não seria útil mencioná-los, pois acabariam originando uma discussão que não tem parte no meu plano. Mas, de fato, essa lembrança me perturbou por horas, me afligindo com suas personagens inesquecíveis, musiquinhas impagáveis e jargões que continuamos a repetir, mesmo que inconscientes da origem. Assistindo aos vídeos, e sentindo uma imensa falta de tudo aquilo, acabei chegando a uma conclusão interessante a respeito de mim mesma.
Minha mãe costuma dizer que ela desconhece outra pessoa que goste tanto de fazer aniversário quanto eu. E essa é a pura verdade, eu amo a passagem do tempo. Amo observar como tenho mudado, e imaginar como estarei daqui a alguns anos. Mas, você imaginaria, uma pessoa assim não deveria sentir-se nostálgica. Foi então que a tal conclusão apareceu de súbito e me deu um soco no nariz.
O que me machuca não é a renovação do tempo, mas a renovação das coisas. Não de qualquer tipo de coisa – você nunca me verá sofrendo pela obsolência do iPod, ou do Pentium 4 – mas das coisas às quais me apego, aquelas que me envolvem efetivamente e que, intimamente, afetam minha alma e até meu espírito. Porém, além do sofrimento pela “dialética natural” das coisas, eu sofro pela dialética das pessoas.
Meu pai percebeu minha dificuldade em desapegar das pessoas quando eu era ainda uma criança – e, diga-se de passagem, estou na espetacular idade de 16 – e sempre me disse que, infelizmente, eu deveria me acostumar a tudo isso. Mas não, não, eu me recuso. Eu não quero esse tipo de mudança na minha vida!
Essa postura pode soar não só egoísta, mas também mimada, porém fico muito amargurada quando penso que este ano – a 3ª série do Ensino Médio – pode ser o prazo final para a maioria das minhas amizades. E, de fato, isso acontece com muito maior frequência do que eu gostaria de admitir. Às vezes escuto pessoas dizendo “Ah, aquela pessoa ali foi uma grande amiga no colegial”. E, ao mesmo tempo em que fala, a pessoa passa, e são como dois estranhos. Seguem suas vidas, vidas que talvez tivessem sido planejadas em conjunto, prevendo futuros encontros que, com certeza, não foram imaginados de forma tão fria e distante, como se o tempo facilmente apagasse qualquer coisa que ali existira.
Não, não, não pode ser assim! O tempo não apaga tudo assim. O tempo encobre, mascara, esconde, mas bastam meios momentos – talvez menos de 45 segundos – para que tudo aquilo seja revelado. Toda dor – bem como toda alegria – explode como um banho de canivetes ou de água morna sobre a alma. Eu, pessoalmente, não gasto meu tempo pensando na dor que reencontros possam me causar. Acho bem mais sensato o esforço em manter aquela chama mágica da amizade, um fogo que consome toda e qualquer coisa ruim que está a nos circundar, ainda que seja só naquele momento.
Meus amigos são a minha alegria, meus irmãos. Eles me animam, me consolam, me dizem a verdade, me fazem acreditar em mim mesma. Eles são como aqueles desenhos da minha infância, que me traziam a pura alegria de simplesmente viver. Querer nem sempre é poder, e meus esforços podem acabar indo, por completo, rio abaixo. Mas, enquanto eles estiverem por perto, eu sorrirei melhor, chorarei melhor, ouvirei melhor e verei melhor. E nenhum outro grupo de amigos poderá me fazer viver da mesma forma. Não estou dizendo que a fatalidade da mudança seria como a morte, porém, pessoas continuam sendo insubstituíveis.
Eu já aceitei que o poder das circunstâncias acaba vencendo o meu próprio poder em algum ponto da vida, então eu treino minhas habilidades de consolar-me através da nostalgia usando a televisão. Eu tenho plena certeza da importância desses amigos para mim agora e, por enquanto, isso basta para minha alma.

Irmão mais velho

Ser a criança mais nova não é exatamente a coisa mais simples do mundo. Especialmente no meu caso. Nasceram cinco filhas e um filho, para então nascer eu. Não que eu esteja reclamando nem nada, mas às vezes eu penso se existia algum complô do Universo ou algum plano maléfico, para me colocar nesse lugar.
Quando eu nasci, minha irmã mais velha já tinha 13 anos; A segunda, 10; A terceira, 8; As gêmeas, 6. Meu irmão tinha 5 anos. E então lá estava eu. Uma gravidez um pouco atrasada, um desejo que veio com a idade. Seis meninas, um menino. Satisfação concedida aos pais.
Minhas irmãs cresceram rapidamente diante dos meus olhos. Tornaram-se adolescentes, adultas. Formaram-se, casaram. Quando eu tinha 9 anos só ganhei minha primeira sobrinha, uma garotinha linda com os olhos azuis da família. Ainda na idade de 12, já era a única menina ainda morando em casa, com os meus pais. E foi quando a tragédia aconteceu.
Meu pai morreu. E de repente, minha mãe viu-se sozinha comigo e com meu irmão de 17 anos. As gêmeas ofereceram-se para voltar para casa e nos ajudar, mas como um coração maternal conseguiria aceitar que as filhas largassem seus sonhos e caminhos apenas para ajudá-la? Com muita coragem, ela resolveu segurar a barra. E eu, com apenas 12 anos, me vi sem nenhuma figura masculina para me orientar naquela complicada transição pra adolescência.
Meu irmão é autista. Ele passa a maior parte de seus dias imerso em seu mp3, pulando de música em música, sem conectar-se com a realidade. Eu passava várias horas ao seu lado, tentando trazê-lo para meu mundo, mas ele nunca respondia. Nunca.
- André, ajuda a Letícia a guardar as almofadas?
- Almofadas. – Ele repetia por algum tempo alguma palavra que eu dissera, até finalmente dar seu veredicto. – Escuto música. Música.
Fernanda e Kátia vinham algumas vezes pra casa. Iam conosco até a praça, onde ele observava passarinhos e, vez e outra, olhava para nós, e dizia entre dentes.
- Sol é bom. – E a luz nos aquecia.
Até que chegou um dia muito importante para mim. Talvez meio fútil, mas era meu primeiro encontro. Mamãe estava em uma reunião, e minhas irmãs estavam tocando suas vidas. Uma de nossas tias havia se oferecido pra cuidar do André por mim, naquela noite. Ela não se cansara de dizer que eu estava linda demais, mas a insegurança me consumia. Não me sentia pronta.
Quando ouvi a campainha soar, desci as escadas afobada. Antes de abrir a porta, porém, decidi tentar mais uma vez com meu irmão. Chamei-o pelo nome, mas ele não olhou para mim. Juntei o fôlego e perguntei:
- André, eu estou bonita?
A cabeça dele se virou lentamente, até encontrar fundo meu olhar. Ele falou com uma voz límpida e consciente.
- Você tá linda.
Logo voltou ao seu mundo paralelo. E eu nunca, em toda minha vida, consegui me sentir mais forte e bonita do que naquele dia, aos 15 anos.

Texto fictício, criado para um concurso de contos de 2010.

Covarde Coragem

Eu tenho medo. Medo, só. Medo de mudar demais, medo de mudar de menos; medo de agradar, medo de desagradar; medo de ser igual, medo de ser diferente; medo de ser sincera, medo de ser falsa. E, às vezes, tenho mais medo de viver do que de morrer. Viver é tão difícil que não só por poucas vezes, eu tenho medo de que tudo isso seja só um sonho. E todo esse medo é por imaginar que, se um dia eu acordasse, as coisas conseguissem ser ainda piores.
Não é como se eu fosse uma pessimista (nem uma obscurantista); Esses ainda tem a coragem de se admitirem assim. Até disso eu tenho medo, de deixar as pessoas saberem o que eu realmente penso das coisas. Tenho medo de deixa-las saberem o que eu realmente penso das coisas. Tenho medo de deixa-las saberem se meus olhos estão opacos ou brilhantes. Tenho medo de deixa-las revirarem-me a alma. Mas, apesar de todo esse medo de viver, o medo de morrer não deixa de existir. Então, acho que prefiro continuar nesse sonho covarde. E, se possível, entrar em outro sonho, dentro deste, onde as coisas pudessem ser menos assustadoras e meu medo pudesse fingir alguma coragem mais sincera.
Mas não vou me permitir tentar esperanças. Eu bem sei que o medo me impede o sono, e que ele próprio me acordaria de qualquer pequeno deleite onírico. Talvez essa certeza de que eu nunca acordarei da realidade me faça mais corajosa. Prefiro ignorar o medo das circunstâncias e seguir com a cabeça erguida, escondendo tudo aquilo que demonstra minha real covardia. É melhor assim.



Dedicado à minha amiga Isabella, a primeira a ler este texto e a quem eu o dei de presente.

I feel like I am walking on air

Eu já tive um número considerável de tentativas "bem planejadas" de criar um blog mas, sinceramente, essa é muito nova pra mim. Um blog "de verdade", que não me cobraria horas e muita criatividade para criar um design inovador, onde eu poderia simplesmente cumprir minhas atividades favoritas: a escrita e o desenho. OK, eu serei sincera, não esperem muita coisa, eu tenho medo de expressar tudo aquilo que eu acho que consigo ser e acabar sendo tachada de "chata", "exibida" e cia ltda. Mas vamos ao básico.

Nome: Luísa A A Ramos.
Idade: 16
Localização: A Terra Gentil que Seduz

Sempre que vou tentar iniciar um projeto novo de blog, eu faço coisas complexas para criar uma apresentação diferenciada, mas serei simples. Espero que alguma alma encontre meu blog, aprecie-o e eu finalmente cumpra meu desejo de "atingir" as pessoas com algum talento que eu possuo. Para finalizar, um haicai que eu produzi em uma modesta aventura por esse tipo de poesia.

E, nas cerejeiras
Florescem hoje, afinal
Sakuras rosadas.


Um beijo.
Luísa.